terça-feira, 22 de março de 2011

Nota da Repartição

A Repartição da Flor é um blog de literatura. Desta vez resolvemos abrir uma exceção; Gabriel, nosso amigo, foi preso de maneira estapafúrdia, sem provas, sem processo e sem flagrante. Foi levado para um presídio e tratado como um criminoso comum, embora tenha apenas levantado uma bandeira, exclamado algo. Hoje Gabriel foi libertado por um Habeas Corpus junto de mais doze pessoas acusadas de estamparem seus adesivos. Sobre o acontecimento nosso querido Ronaldo escreveu este belo artigo que decidimos compartilhar no blog: Paz - e guerra!

Paz - e guerra! (e barbas de molho)

▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒Qual é a força que move as nações?
▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒▒Tolstoi. Guerra e paz.

▒▒▒A História demonstrou que, como a biografia dos homens, define-se muitas vezes pela ironia.

▒▒▒Machiavel é rico em exemplos do que se afirma, quando resolve citá-los, quer a propósito de Roma, quer do Príncipe. Ironias, entretanto, transformam-se em sarcasmo, quando, antes que saibamos quem será a vitima, ela já se estampa diante dos nossos olhos, como num espelho, com a nossa própria fisionomia.

▒▒▒Quis a ironia que presenciássemos a concessão do prêmio mais importante da Paz, a um senhor da Guerra. Desde as bombas de Hiroshima e Nagasaki, a democracia norte-americana não se impõe como uma nação pacífica. Cabia parar e pensar diante de um país envolvido com dois importantes conflitos, no Afeganistão e no Iraque, antes que alguém, a qualquer pretexto, sugerisse escolher Barak Obama para uma homenagem de tal porte. Conviria, antes, aguardar os acontecimentos. Ele, diga-se a seu favor (quem sabe por ironia?), mostrou-se até constrangido ao tomar conhecimento da distinção.

▒▒▒A mais recente é a escolha do cenário brasileiro, durante o encontro formal entre chefes de Estado (note-se que o Brasil se absteve diante da resolução da ONU autorizando a iniciativa), para o anúncio da inauguração de um terceiro conflito, agora contra Kadafi, para que, sobre os anteriores, comecem a empilhar os corpos da população líbia. Não bastavam os cadáveres calcinados com que atapetaram o seu caminho (incluindo os de soldados americanos), ou os saques aos tesouros arqueológicos da antiga mesopotâmia e sua perda talvez definitiva. A indústria bélica exige – e não transige. É um jogo conhecido, mas, por favor, deixem de lado a palavra Paz.

▒▒▒Por infelicidade, uma ironia sempre evoca outra. Rompendo a anuência servil dos nossos dirigentes no trato da visita oficial de Barak Obama, alguns jovens resolveram protestar. Motivos não faltavam. Feria a sensibilidade a entrega da Cinelândia, palco de honrosas manifestações, para que um dirigente estrangeiro realizasse um comício, algo que só não se consumou pelo excesso de exigências de sua segurança. Isso já acontecera na Alemanha, salientarão. Verdade. Só que lá, ainda não se tratava de um mandatário, era apenas um candidato que aspirava ao cargo. O Teatro Municipal, casa destinada ao exercício da música erudita, por outro lado, não correspondia ao perfil do que com ela se pretendia. Não espanta que a diretora da casa haja declarado que a notícia lhe caíra (metáfora perfeitamente adequada) como uma bomba na cabeça. O Itamaraty, o Palácio do Planalto, tudo bem. Mas o Municipal, belo e reformado, no auge da sua grandeza, para servir de palco a novas ironias... Por quê?

▒▒▒Aos manifestantes, como se vê, não faltavam razões. Queriam prestar uma homenagem a Nelson Rodrigues e quebrar a unanimidade burra com que se desejava ostentar a passividade da índole nacional. A resposta, bruta e desproporcional, trouxe à memória (em nova ironia) os tempos da ditadura, quando se prendia e batia por delitos de opinião. Medidas conscientes de Governo, sem dúvida, uma vez que as autoridades não se limitaram a deter os participantes. Transferiram-nos para presídios, numa espécie de condenação simbólica sem relação com o tamanho dos atos.

▒▒▒Como os demais do grupo, Gabriel de Melo Souza Paulo, aluno da Faculdade de Letras da UFRJ, teve os cabelos raspados. Na época, fizeram o mesmo com Caetano e Gil, para que se enquadrassem no sistema. É um estudante apreciado por todos pela suavidade com que sabe discordar e defender pontos de vista.

▒▒▒A ele, saúdo pela coragem. E faço um apelo para que conserve a tenacidade, não dobre a espinha. Com ou sem ironias, não desista. Guarde sempre o Gabriel que admiramos.

Ronaldo Lima Lins

sexta-feira, 11 de março de 2011

Apelação em favor da amizade

Perdi o jus de amar-te como homem
no tribunal que os dois de nós armamos.
Sem provar nada, ao Sol, calor de ontem,
sentenciamos fim. Quem hoje somos?

O amor ficou, mas falta, ao mesmo tempo,
é viuvez de quem mal fez-se noivo.
E como pesa o peito sem o peso
que acustumara usar do teu repouso!

Tudo se vai, mas falta não se vai,
que a falta é o tudo que restou nas mãos.
Portanto, apelo, se me cabe um ai,

mesmo assentado o júri pelo Não:
Vai, me concede amar-te como um pai!
Vai, me permite amar-te como irmão!

segunda-feira, 7 de março de 2011

De volta

Vincent Van Gogh
Jardim florido - Vincent van Gogh