quinta-feira, 18 de março de 2010

Sobre teus pés de Portinari

Eu gosto dos teus pés,
que levam teu sorriso às pessoas.
Lembram o trabalho daqueles rizicultores de Yunnan, na China,
que metem, na lama, as mudinhas do que será
sangue nos ossos e nuvem nos céus das bocas.

Eu gosto dos teus pés:
mantêm distância apropriada
entre o futuro do mundo
(que incubas num ninho logo acima do teu nariz)
e o passo concreto que dás.
O sonho ganha tempo para percorrer teu corpo
até alcançar a forma necessária
de um próximo passo.

Acho bonitos os teus pés.
São fortes e bem-humorados.
Queriam ser pés de soldado e palhaço.
Depois, viram que não era bem isso.
E, então, descobriram que poderiam
(se fosse preciso, até a velhice)
ser pés de criança descalça.

quarta-feira, 17 de março de 2010

carnaval para j. p

Orava a nuvem a consolação
no mar, martirizando no poeta
uma canção. Raiava quarta-feira
já, lembrou Recife, a serra e um verso
de Drummond. Pela noite quis de amor
matar e pela tarde quis de amor
perdão. Eram os barcos que partiam
aqui e lá, mãos de mulher, dores de sim
de não; fevereiro, sopra seus barcos
e solta, como a flauta o sol no ar;
solas de sapato, boi, baco, brilha
um balão, oh padre do paraná.
Nuvens do céu, sem deus, desçam ao chão,
o tempo é algo quente como um lar.