quarta-feira, 28 de janeiro de 2009

Licores

De vez em quando, a estante dos licores
afasta o bom rabino dos louvores
e arrisca a gola branca a novas cores.
Uns cálices depois, certos horrores

vernáculos das mentes de senhores
gentis demais às damas nos favores
escapam. São suspiros, são calores
fingidos, sob a rolha, de sabores

de frutas e ervas finas. Pois imunes
aos anos, apurando seus queimores,
as caldas melindrosas dançam tango

nas vulvas vidraçadas com os numes,
que ganham vida e tomam corpo quando
o bom rabino as vem amar. Licores.

sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

Soneto para um novo amor

Distante dos meus deuses naturais,
temendo ter traído minha pátria,
por blocos de antiquados carnavais
errei, mas quem assim já não errara?

Sentei-me à beira-mar e tive um frio
que foi como se eu não vestisse nada.
Na orla, à noite, mil luzes do Rio
dançavam com as ondas e eu chorava.

Mas quem já não morrera assim, amigos?
E quem já não jurara à lua clara:
- Jamais um novo amor será cantado!

Só sei que algum calor aos arrepios
pôs fim e um querubim da Guanabara
secou meus olhos. Eu jurava errado.

quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

Amor em dialética

Tudo quanto acresce faz crescer. Transforma,
no brindar dos corpos, e deforma e mata,
a conformidade duma antiga forma,
dando luz a novas, netas da passada.

Essas somas causam sempre um certo dó,
confundindo à força o que é de dentro e o fora:
dores de fornalha, de martelo e mó
que vão duvidar se é benfeitora a soma.

Mas se tudo quanto assoma fere e muda
o horizonte e a ilha de antes de somar,
a fusão das partes logo arvora uma
recriada praia, que esmerada e forte,

será tão plural quanto for singular.